O Eco dos Pássaros
zine digital | edição #4
o eco dos pássaros | próxima edição
Nota introdutória
Estaremos nós a contrapor a diáspora da nova era? Ontem esta questão ecoava na minha cabeça sabendo, à partida, que possivelmente fosse mais uma utopia.
Ao longo dos séculos, muitos foram os povos que se viram forçados a deixar as suas origens por imposições religiosas, políticas e/ou sociais. Mesmo que as civilizações tenham evoluído, ainda não tornámos real a fantasia de ver a humanidade a viver em harmonia e com respeito mútuo. Infelizmente, acredito que os humanos se auto-dizimarão antes de conseguirem esse feito. Por isso, ainda nos dias de hoje, assistimos a fluxos de refugiados que, aos olhos dos países "evoluídos" são escandalosos mas que, rapidamente, deixam de fazer parte das nossas preocupações depois de deixarem de ser notícia.
Assim nos temos vindo a tornar, nós, os "evoluídos", cada vez mais presos no mediatismo mas de memória curta que nos limita a atuação em prol de todos, solidariedade.
A par de questões que nos acompanham há milhares de anos e que não soubemos ainda resolver chegou-nos a era digital. Com ela novos termos, novas facilidades mas também novas formas de vida. Algumas delas, não tenho medo de assumir, são mais uma ausência de vida que eu mesmo sinto na pele. A tecnologia avança e de repente, entramos num novo mundo onde estamos todos ligados, todos mais acessíveis mas gradualmente mais distantes. E nesta linha de pensamento questionava-me se estaríamos nós a viver uma diáspora digital. Atribuir-lhe este termo pode soar um pouco incorreto pois na verdade ninguém está a ser forçado a mover-se das suas origens, mas quando o mundo virtual e aquilo que lá aparentamos se sobrepõe à nossa realidade podemos estar a clivar um rasgo de isolamento que por norma não tem final feliz.
Ontem esta questão ecoava na minha cabeça. Um amigo que deixa de aparecer e apenas reage on-line ou um familiar que não comparece numa reunião de família e a substitui por um audio de whatsapp podem, facilmente, ocultar um problema, uma fraqueza, um anseio, uma dor. E nós, nós achamos que está tudo bem, que não compareceu porque tinha outras prioridades, que estaria com outros planos. E passa-se o tempo, passam-se os momentos e a história repete-se mas os likes, as mensagens e os áudios continuam a comparecer até que um dia, inesperadamente, deixam de chegar. E quando deixam de chegar sentimo-nos impotentes. Sentimos que não nos apercebemos, que não pode ser possível, que não faz sentido. Mas nós, longe das nossas origens, na diáspora digital, não soubemos estar sensíveis e atentos aos que nos rodeiam.
Ontem esta questão ecoava na minha cabeça. E, afortunadamente, com amigos à mesa, brindávamos à vida, à felicidade e aos sonhos. Depois ouvimos música e acompanhámos a terceira sessão e "O Eco dos Pássaros fora da Gaiola". E foi nesse momento que vimos o lado bom do mundo digital a servir o seu propósito maior, juntar pessoas. Pessoas que não se conheciam de lado algo e que passam a partilhar experiências, cultura e, principalmente, convites para se reunirem sem ecrãs, sem telemóveis, sem rede e sem wifi. Apenas pessoas, juntas, a viver a sua natureza humana. Foi aqui que questionei se estaríamos nós, naquele momentos, à nossa escala, a contrapor a diáspora da nova era. Quero acreditar que sim não porque cheguei a esta conclusão por mim mas porque os autores que acompanhei ontem mo comprovaram. Este é de longe o melhor resultado deste grupo. Obrigado!
A quarta edição da zine surge no após os primeiros dias de desconfinamento e queremos que alimente este fluxo de escritores que procuram a verdadeira partilha.
Luís Caracinha