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Cauda de Dragão

Niro vasculhou por todas as gavetas, mas não encontrava o frasco com a cauda de dragão bebé preservada em álcool. As suas mãos trémulas verificavam todos os rótulos com cuidado, só para ter a certeza que a escuridão da cave não enganava os seus olhos. Como é que tinha perdido o bem mais valioso que alguma vez passara pelas suas mãos inúteis?!

Se não tivesse o frasco quando os trasgos do Sindicato aparecessem na sua loja de poções, ele era um homem morto. Mas era impossível encontrar o que quer que fosse no meio de tanta tralha, sobretudo quando o seu cocatriz de estimação, Bosco, não parava de saltar de um lado para o outro e derrubar tudo o que via à frente, qual gato.

As mãos de Niro tremiam ainda mais quando ele se começava a aperceber que o frasco era mais impossível de encontrar do que um maldito unicórnio. Unicórnio? Nesse momento, lembrou-se e olhou para a estatueta de unicórnio sobre o armário e levou a mão à parte de trás, apanhando um frasco. Ao ver a pequena cauda de dragão suspensa no álcool, as lágrimas quase lhe vieram aos olhos.

Mas as suas mãos ainda tremiam tanto que o frasco fugiu-lhe dos dedos e estilhaçou-se no chão. Pouco preocupado, Niro tentou apanhar a cauda reptiliana para a pôr noutro frasco, mas Bosco saltou de cima do móvel e devorou-a de uma só vez. A espinha de Niro gelou.

— Maldito lagarto com cabeça de galo!

Alguém batia à porta da loja. Tinham de ser os trasgos. Estava morto. Percebendo que teria de lutar pela sua vida, Niro pegou na faca que usava para cortar sementes de dríade.

Então, ouviu o seu cocatriz a cacarejar despreocupadamente e os seus nervos acalmaram-se um pouco quando um plano surgiu na sua cabeça. Com cuidado, agarrou no animal e cortou-lhe a ponta da cauda reptiliana, procedendo a colocá-la num frasco com álcool e escrever no rótulo “cauda de dragão bebé”.

Quando recebeu os trasgos rezingões, deu-lhes o frasco e estes pareceram satisfeitos, para seu alívio. Só quando se foram embora é que os nervos de Niro finalmente desapareceram. Sabia que Bosco o perdoaria, afinal a ponta da cauda voltaria a crescer.

Agora era rezar para que aqueles trasgos estúpidos nunca percebessem que tinham uma cauda falsa, ou um destino muito pior do que a morte esperaria Niro.

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Hugo Campos

Nasceu em 1991 e cresceu na cidade de Lagos, encontrando-se atualmente a morar em Loulé.
O seu gosto pelo fantástico levou-o desde muito cedo a inventar histórias sobre lugares e personagens inexistentes, num universo partilhado chamado Taurac.
Gosto de escrever especialmente poesia, mas também prosa.
O ano passado ganhei o primeiro premio no concurso "A mais bela carta de amor" na localidade onde resido. Foi organizado pela câmara e pela Biblioteca Municipal. Foi maravilhoso a primeira vez que concorri ganhar o primeiro prémio. Foi um incentivo para continuar a escrever.
Também já participei em vários encontros de poetas.
O meu sonho é editar um livro de poesia.

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